O Brasil inicia 2025 em meio a uma profunda crise de confiança, cujos efeitos adversos inevitavelmente se manifestarão, mais cedo ou mais tarde, no crescimento econômico e na inflação.
Para evitar esse cenário, seria necessária uma mudança substancial na política fiscal. No entanto, tudo indica que, até que o país se veja diante de dificuldades mais agudas, pouco ou nada será feito.
Reformas essenciais para garantir o controle dos gastos e a sustentabilidade da dívida em um horizonte viável exigem um consenso político e social que, historicamente, só se torna possível quando a gravidade da crise provoca uma insatisfação generalizada na população.
Nos Estados Unidos, por exemplo, as reformas implementadas por Ronald Reagan entre 1981 e 1989, conhecidas como “Reaganomics” —baseadas na redução de impostos, cortes de gastos (exceto na área de defesa), diminuição do papel do governo, desregulamentação, entre outras medidas— não eram ideias novas.
Contudo, o eleitorado americano demorou a abandonar o consenso keynesiano do pós-guerra. Foi necessário uma combinação de inflação e desemprego extremamente elevados para que a população aceitasse uma ruptura abrupta com o modelo vigente.
De maneira similar, o Reino Unido sofreu uma crise dramática antes de os eleitores darem apoio irrestrito ao governo de Margaret Thatcher.
As reformas neoliberais da premiê só foram implementadas a partir de um cenário com inflação alta —que ultrapassava 20% no final da década de 1970—, paralisação do país por uma onda de greves em setores essenciais, perda do poder geopolítico da antiga potência e o polêmico empréstimo solicitado ao FMI em 1976.
Atualmente, países como Inglaterra, França e Alemanha parecem aprisionados em modelos econômicos falhos. Mas, apesar do desconforto com o status quo, suas condições econômicas ainda não são suficientemente graves para justificar os custos das reformas indispensáveis.
Em contrapartida, os países do sul da Europa, como Espanha, Grécia e Portugal, apresentam um cenário mais positivo, em função das reformas realizadas em diversas frentes sob forte pressão durante a avassaladora crise da Zona do Euro em 2010.
Folha Mercado
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Quando olhamos o Brasil, observamos que frequentemente precisamos enfrentar crises profundas para implementar reformas, como o Plano Real de 1994, a instituição da Lei de Responsabilidade Fiscal e as alterações na Previdência em governos distintos. A criação do teto de gastos só foi possível após um período de intensa instabilidade econômica que gerou a maior recessão da nossa história.
Hoje, a resposta fiscal passa necessariamente por uma mudança significativa no crescimento dos gastos obrigatórios. A agenda seguinte precisará abranger um redesenho completo de todos os benefícios sociais, que hoje não reduzem a desigualdade como deveriam e, em alguns casos, favorecem a concentração de renda. Também será imprescindível uma nova reforma da Previdência.
Líderes políticos devem agir com visão de longo prazo, adotando uma postura preventiva para corrigir problemas antes que se agravem. É papel do Executivo, na figura do presidente, conduzir esse processo, repartindo o protagonismo com o Congresso, ciente do desafio de lidar com um Legislativo cada vez mais independente no campo orçamentário.
Infelizmente, a história tem mostrado que, muitas vezes, mudanças indispensáveis só acontecem quando o custo da inação já é muito alto. Esse deverá ser nosso caminho nos próximos dois anos.
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Fonte: Folha de S. Paulo