Você concorda que não se compra uma ação só porque ela caiu? E que uma ação mais atrativa é aquela cuja empresa tem maior expectativa de crescimento e bons dividendos? Então, se o dólar fosse uma ação, você compraria agora?
Esta é uma boa forma de pensar na moeda: como a ação de um país. E, como toda ação, ela tende a subir quando há crescimento, juros atrativos e contas públicas organizadas, ou seja, endividamento. Se esse for o critério, o Brasil parece estar ganhando alguns pontos relativos no placar.
Depois de bater R$ 6,20 no final de 2024 —uma máxima histórica que causou pânico nos investidores—, muitos correram para comprar dólares, acreditando proteger seu poder de compra no exterior. Mas o que parecia uma reação sensata se revelou, com o tempo, uma armadilha emocional.
Desde então, o real já se valorizou quase 10%. Isso significa que, mesmo considerando a taxa básica americana de 4,3% ao ano, um investidor que aplicou em renda fixa de curto prazo nos EUA já acumula mais de dois anos de prejuízo apenas com a variação cambial. Para quem pensava estar fugindo de riscos, o resultado foi o oposto: o risco se materializou rapidamente.
E esse prejuízo pode não ter acabado. Segundo o Morgan Stanley, o dólar ainda pode cair mais 9% diante de outras moedas, impulsionado pela expectativa de desaceleração econômica nos Estados Unidos e pelo movimento global de diversificação para mercados emergentes.
Do lado brasileiro, há ventos favoráveis. O crescimento esperado da economia em 2025 gira em torno de 3%, o dobro do projetado para os Estados Unidos. Os juros no Brasil continuam entre os mais altos do mundo. Isso torna o real atrativo para investidores estrangeiros, especialmente por meio do chamado “carry trade” —estratégia que busca lucrar com o diferencial de juros entre países, captando recursos onde os juros são baixos e investindo onde são mais altos.
Em termos de responsabilidade fiscal, os dois países parecem disputar quem erra mais. Mas, nesse quesito, o real tem ganhado força não por mérito absoluto, mas porque o dólar também mostra fraquezas. Os déficits americanos continuam elevados, e os riscos inflacionários persistem.
Investir em ações americanas também exige cautela. A expectativa de uma desaceleração econômica mais forte e a volta das tensões tarifárias são um banho de água fria nos resultados das empresas. Analistas estão revisando os lucros para baixo.
Na renda fixa americana, o dilema persiste. Os juros longos por lá seguem pressionados, o que torna os títulos prefixados ainda mais arriscados, enquanto os papéis curtos são desfavoráveis comparados ao CDI brasileiro e risco de desvalorização.
O cenário mudou. Nesse ambiente mais desfavorável para a renda variável e a renda fixa americana, as perspectivas de curto prazo para obter retorno real positivo investindo em dólar se reduziram.
Nesse contexto, vale lembrar que diversificar não é apenas espalhar o dinheiro entre moedas ou ativos diferentes. É buscar combinações que reduzam o risco sem comprometer o retorno. Se, ao investir em dólar, você eleva o risco e reduz sua expectativa de ganho, isso não é diversificação. É distração. E uma distração cara.
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Fonte: Folha de S. Paulo